Em pesquisa conduzida pelo grupo SharpBrains, liderado por Elkhonon Goldberg, discípulo de Lúria e professor na Universidade de Nova York, os pesquisadores utilizaram um questionamento on line, com 1910 pessoas participantes, sobre quais funções mentais seriam mais importantes no século XXI para o florescimento da suas vidas pessoal e profissional?
   As três principais funções mentais que apareceram foram:

1. Habilidade no manejo do estresse;

2. Poder de concentração para evitar distrações;

3. Ser hábil em reconhecer e controlar uma emoção;

   Vivemos em um mundo rápido e em crescente pressão. Somos bombardeados de informações o dia todo, mas também estamos o tempo todo recebendo e elaborando informações de caráter emocional que se misturam às nossas experiências pessoais que tivemos ao longo da vida (um turbilhão em nossas memórias episódicas ou autobiográficas, de fatos, que são memórias explícitas, mas também editadas em nossa mente para fazerem sentido, somadas às nossas memórias emocionais, implícitas, inconscientes, do ponto de vista cognitivo). Pode-se perceber que todas as funções mentais listadas apresentam relações com estresse, emoções, motivação e atenção, mostrando a importância reconhecida de lidar com tais problemas centrais do nosso dia a dia e treinar habilidades para melhor resolvê-los.
   Reconhecemos também a necessidade de mudanças nos nossos padrões comportamentais e de novas aprendizagens, mas somos acometidos da procrastinação e do medo e dor relativos às mudanças (saiba mais sobre mudanças em: https://rodrigosartorio.com.br/mudancas-sao-dolorosas/). Quais os principais recursos e que comportamentos e hábitos devemos cultivar para alcançar tais melhorias? Todos nós sabemos muitos motivos e a importância das atividades físicas na melhoria da saúde e qualidade de vida.

   Portanto, o hábito inicial para se atingir os objetivos propostos para o florescimento pleno de nossa vida pessoal e profissional é a inserção de exercícios físicos variados e regulares na nossa rotina. As atividades físicas estão na base das nossas necessidades biológicas, evoluíram com nossos corpos e mentes e, exceto se você não tem um corpo, dificilmente conseguirá desenvolver as habilidades de controle do estresse, da atenção e das emoções sem esse componente. Atividades físicas regulares propiciam a neurogênese (formação de novos neurônios) e evitam o declínio cognitivo.

   Uma alimentação equilibrada e dieta a base de frutas, verduras e carboidratos integrais se ajustam perfeitamente ao primeiro hábito e, parece mesmo que o corpo exercitado pede a mudança na alimentaçãos. A figura 1 ajuda a compreender essa dinâmica e apresenta um modelo de prato de alimentação saudável e pirâmide alimentar revisada pela Universidade de Harvard, que refuta a versão anterior americana de 1992, repleta de vieses políticos e mercadológicos (saiba mais em https://www.hsph.harvard.edu/nutritionsource/).

                           Figura 1: Prato de alimentação saudável e Pirâmide alimentar de Harvard.

   Para seguir nos hábitos que devemos adquirir e cultivar para melhorar nossas habilidades emocionais e cognitivas, as técnicas de relaxamento e meditação têm sido amplamente testadas e validadas, com melhorias significativas no que tange aos sistemas atencionais, aumento do foco e na formulação de objetivos e propósitos de vida mais claros, além de auxiliar no controle das emoções e do estresse. A Meditação de Atenção Plena (Mindfulness) é a mais pesquisada. Na verdade, a maioria das técnicas de relaxamento e meditação, apresenta alguma melhoria cognitiva e emocional, se conduzida com seriedade e ensinada corretamente. O mais importante é que a técnica possibilite aumento na atenção e controle dos pensamentos e emoções. Respirar apropriadamente e mesmo se concentrar nessa atividade fisiológica automatizada parece melhorar significativamente nosso controle cognitivo e emocional.

   O sono é um componente universal quando se fala de melhora em habilidades cognitivas e, em especial, na facilitação em formar novas memórias. É durante o sono que nossas memórias são processadas e maximizadas, e existe intensa atividade do hipocampo, área do cérebro responsável pelo processamento das memórias, durante as ondas teta (sono leve) e, em especial, durante o sono REM, ou sono paradoxal, momento no qual as ondas eletroencefálicas curtas e rápidas estão em sincronicidade com nossos sonhos, este mecanismo maravilhoso de estruturação psíquica e reformulação das experiências cotidianas. A diminuição do tempo e da qualidade de sono gera estresse e morte neural das áreas atreladas à memória, bem como, adoecimento. Uma boa noite de sono, além de reparadora para o cérebro e para o restante do corpo, é um poderoso mecanismo para aflorar nossos potenciais.

   Ainda existe a crença de que procurar um psicólogo é coisa para gente louca ou com algum problema. Na verdade, cada dia mais as diferentes psicologias têm se preocupado não na cura das doenças mentais, mas sim, nos mecanismos para evitá-las, com destaque para a psicologia positiva, cujo foco não está na perpetuação da alegria, mas sim, no que Martin Seligmann denominou de Satisfação frente à vida. A psicologia positiva trabalha as emoções, não enquanto juízo de valor (boas ou más), mas no uso positivo das mesmas ainda que seja de uma tristeza ou dor, e na interpretação e uso positivo de uma alegria. A terapia cognitiva comportamental, a partir de um leque variado e validado de exercícios, tem se destacado como um método rico em evidências de sua eficácia, em especial no que tange a reestruturação cognitiva, a ressignificação de hábitos, emoções e memórias, bem como, no controle de comportamentos indesejados ou prejudiciais que, na maioria das vezes, não temos a percepção clara de que ocorram ou que nos atrapalham.

   Por último, em um crescente de sofisticação, nossas capacidades de resolução de problemas e nossas habilidades sociais devem ser treinadas e melhoradas a partir de exercícios cognitivos, jogos e brincadeiras (sim, nossa espécie evoluiu para um modelo onde o brincar se tornou parte do repertório comportamental de adultos, e é de extrema importância para o desenvolvimento de habilidades cognitivas e sociais). Além de jogos e brincadeiras, os contextos de estimulação com os amigos podem ser fatores de estresse ou de saúde. Portanto, buscar interações com pessoas interessantes e interessadas, em um mundo mais empático, cooperativo e cognitivamente rico parece ter impacto significativo para um maior controle dos aspectos cognitivos e emocionais. Todos nós, em todos os extratos sociais e níveis socioculturais temos possibilidades de interação com pessoas interessantes para conversar e trocar ideias, que nos apresentam novos modos de pensar e agir, com simplicidade, mas também sabedoria. Além disso, ler um bom livro de literatura nos apresenta diferentes pessoas e ideias, mesmo que de forma ficcional ou em uma narrativa de uma vida diferente da nossa. Conversar com pessoas fora do nosso circuito habitual, que têm outras habilidades e estilos cognitivos pode ser muito estimulante para o cérebro e oferecer visões de mundo surpreendentes.

   A pesquisa conduzida pelo grupo do Professor Goldberg ainda apresentou as outras sete funções mentais que foram consideradas importantes no florescimento da vida pessoal e profissional:

4. Processar uma nova informação rapidamente;

5. Definir e perseguir objetivos pessoais principais;

6. Ser hábil em monitorar e controlar um processo mental;

7. Habilidade em lidar com situações novas e incertas;

8. Planejamento das ações e resolver problemas de forma sistemática;

9. Habilidade para multitarefas;

10. Relembrar faces e nomes.

   Importante destacar que todas elas estão relacionadas com controle cognitivo e emocional. No que tange aos conhecimentos já obtidos em estudos da psicologia, educação e neurociências, e o que já se sabe inclusive em termos de concepções alternativas, ou seja, que está no imaginário das pessoas em geral, é que para atingir tais melhorias, as atividades físicas e bons hábitos alimentares, o relaxamento, meditação e sono, a busca por estímulos e terapias que nos permitam uma reestruturação cognitiva, a resolução de problemas de forma sistemática (saiba mais sobre estimulação cognitiva em https://rodrigosartorio.com.br/aptidao-cerebral-e-treino-cognitivo/), e cultivar bons hábitos sociais e boas amizades são os pilares básicos para uma vida mais saudável, equilibrada e de melhor regulação interna.


Bibliografia:

Fernandez, A., Goldberg, E., and Michelon, P. 2013. The Sharp Brains Guide to Brain Fitness: How to Optimize Brain Health and Performance at Any Age. Washington, DC: SharpBrains. Disponível em: https://mybook.to/brainfitness. Acesso em: jan.2015.
Roma, A. e Perez Corrêa, A. 2016. Psicologia Positiva. Teoria e Prática. Conheça e Aplique a Ciência da Felicidade e das Qualidades Humanas na Vida. São Paulo: Editora Leader. 456p.
Seligman, M. E. P. 2003. Felicidade Autêntica. Rio de Janeiro: Ponto de Leitura.
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