Em humanos, estudos sugerem dois padrões na formação dos casais: O pareamento concordante (homogamia) e, o pareamento discordante (heteronomia ou complementariedade). As características de tais pareamentos decorrem de fatores genéticos, culturais, sociais, emocionais, traços de personalidade, cognitivos. Vamos discutir algumas variáveis que perfazem nossas escolhas na formação de casais, tendo como base o texto “Dinâmica e qualidade dos relacionamentos: Manutenção e Dissolução” de Fernandez, Shiramizu e Valentova (2018), capítulo do livro “Manual de Psicologia Evolucionista”, organizados pelas matriarcas da Psicologia Evolucionista no Brasil, Maria Emilia Yamamoto e Jaroslava Varella Valentova.

   A manutenção da relação apresenta diferenças entre machos e fêmeas, pode variar de acordo com a história de vida familiar do indivíduo, bem como, das condições de desenvolvimento de si e dos filhos. Fatores ecológicos, sociais e econômicos são multivariáveis que interferem nessas possibilidades e os padrões podem flutuar no espectro, então que, importante avaliar a média e olhar os extremos com zelo. Talvez o ditado “os opostos se atraem” tenha um grande valor na físico-química, mas, pode ser um alerta para relacionamentos. Existem estratégias para muitas das possibilidades negativas nos dois padrões, tais como, aconselhamento genético, planejamento da estrutura familiar e filhos, psicoterapia de casal, para os ajustes sempre indispensáveis. Eu sugiro que diálogo já propicia uma ampla fluidez positiva dos pareamentos, sejam quais forem os mesmos.

   Fatores genéticos parecem estar implicados nas formações dos casais. Pareamentos concordantes ou em homogamia extrema podem apresentar um alto grau de endocruzamento, ou, casamento consanguíneo, que são os acasalamentos com pessoas aparentadas, que geralmente acarretam em diminuição da variabilidade genética e/ou, aumentado risco de genes deletérios (diminuição da variabilidade de respostas do sistema imune, causa de doenças e transtornos, e interferem nas capacidades de sobrevivência e autonomia). Se os parceiros são muito semelhantes em termos de personalidade, comportamentos e preferências, é possível que o sejam também do ponto de vista genético. Pareamentos por interesses, como dos nobres na Europa, foram impactantes em termos de saúde, tendo em vista que a manutenção de títulos e propriedades faziam com que muitos casamentos fossem entre primos, tios, tias e seus sobrinhos e sobrinhas. A longa linhagem de pessoas com hemofilia na família real inglesa é um exemplo muito ilustrativo, assim como, as faces pintadas de reis na Europa ocidental e seus traços até rudes, com deformidades, assimétricos, com grandes e proeminentes maxilares nos oferecem testemunhos das relações, diríamos, incestuosas, endogâmicas e deletérias da manutenção de pareamentos concordantes em diversos níveis.

   Os casais parecem ser muito similares no que tange às condições socioeconômicas, educação e religião, assim como, em traços de personalidade (estabilidade emocional e autoestima) e, características físicas como estatura, nível de atratividade e formato do rosto. Parceiros parecidos relatam maior satisfação com o relacionamento e com a vida se comparados a parceiros complementares. A homogamia pode decorrer também da familiaridade, podendo conferir maior confiança no parceiro e aumentar o nível de seleção de parentesco, já que, casais mais semelhantes podem compartilhar mais genes e, assim, haver maior nível de altruísmo entre os pares. A escolha de parceiros semelhantes poderia ainda ser efeito de uma estampagem sexual, na qual os traços do progenitor de sexo oposto seria buscado em parceiros românticos como uma forma de aprendizagem de um biótipo mais “confiável”.

   Por outro lado, pareamentos discordantes ou complementares parecem ser, até certo ponto, um mecanismo que diminuiria a probabilidade de semelhanças genéticas, com consequente aumento da variabilidade e diminuição do aparecimento de genes deletérios com duas cópias (do material genético do pai e da mãe), caraterísticas extremas seriam eliminadas (pode ser adaptativo para manter uma estatura média entre os filhotes, quando um parceiro de menor estatura média busca outro mais alto, ou realçar traços desejados). Também as características dos parceiros românticos são escolhidas frente aos traços que complementariam um ao outro, no entanto, os pareamentos heterogâmicos parecem ser mais instáveis quando as diferenças sociais e traços de personalidade são possivelmente conflitantes, alguns traços marcantes ou exóticos podem ser atrativos em um primeiro momento, mas, se mostram menos estáveis a longo prazo (FERNANDEZ, SHIRAMIZU, VALENTOVA, 2018).

   A combinação entre características concordantes e discordantes em diferentes aspectos parece ser adaptativa, incluindo aí fatores sociodemográficos, econômicos, personalidade e hierarquia. No que tange ainda à hierarquia, casais mais dissimilares para dominância e submissão relataram maior satisfação no casamento, assim como, casais mais semelhantes na cordialidade, mas, diferentes quanto à dominância relataram serem mais satisfeitos na relação, o que regularia a agressão e conflitos e aumentaria as chances de relacionamentos de longo prazo (FERNANDEZ, SHIRAMIZU, VALENTOVA, 2018).

   Com base no texto acerca da Dinâmica e qualidade dos relacionamentos, exploramos apenas um aspecto do capítulo sobre o assunto, os pareamentos, os autores oferecem muitos outros. Também o Manual de Psicologia Evolucionista é um texto amplo sobre a Psicologia Evolucionista, e nas suas mais de 840 páginas aborda os principais aspectos da natureza evolutiva de nossos comportamentos, emoções, personalidades. Fica o gostinho para querer mais, o livro é de acesso aberto, podendo ser baixado pelo link disponível na referência bibliográfica.

Referência Bibliográfica:
FERNANDEZ, A. M., SHIRAMIZU, V. K. M., VALENTOVA, J. V. Dinâmica e qualidade dos relacionamentos: Manutenção e Dissolução. Em: Manual de Psicologia Evolucionista. Maria Emilia Yamamoto e Jaroslava Varella Valentova (orgs). 1. ed. Natal: Editora da UFRN. 2018, pp.365-384. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/26065.