Prof. Dr. Rodrigo Sartorio – Mentalize Educação e Treinamentos
Indivíduos são pouco dispostos às mudanças em seus hábitos, até quando isso significa riscos para suas vidas (apenas duas em cada nove pessoas mudam seus hábitos em decorrência de doenças nas coronárias). Como alterar comportamentos quando se trata de uma organização inteira?
Mudanças são dolorosas, são fisiologicamente dolorosas, pois o cérebro necessita um grande gasto de energia, sendo necessário o uso de área de maior complexidade para processar a mudança e começar a lidar com o novo ambiente ou processo. Além disso, as mudanças nos ambientes corporativos geram inseguranças relativas a estes ambientes, que ao mudarem, podem significar perigos e ameaças. Por isso, muitas vezes, os colaboradores não se sentem felizes ao se depararem com um novo processo de produção ou um novo equipamento a ser utilizado. Por este motivo, se faz necessário investir nas formações e treinamentos, diminuindo a insegurança e, promovendo desafios e novidades, também necessários ao cérebro para se sentir motivado e estimulado.
Expectativa molda a realidade: pré-concepções das pessoas têm significante impacto na maneira como elas percebem – exemplo do efeito placebo – pessoas experimentam aquilo que elas esperam experimentar. Quando os líderes oferecem sugestões e promoverem insights para suas equipes gera menos resistência à mudança.
A plasticidade neural ou neuroplasticidade é caracterizada pelas alterações estruturais, fisiológicas e químicas do sistema nervoso decorrentes de aprendizagem, lesões, experiências. Price, Verne e Schwartz (2006) demonstraram que nossa neuroplasticidade é autodirigida, nós mantemos a atenção em determinadas coisas graças a nossa genética, experiências e particularidades; mas também podemos dirigir nossa neuroplasticidade para objetivos e metas, propósitos de vida e propósitos de transformação massiva. Muito da eficiência de um líder constitui da sua capacidade em fazer o outro focar sua atenção, e de conhecer preferências e especificidades em termos de habilidades e competências nos seus colaboradores (cada líder deve construir um inventário dos seus colaboradores diretos dentro da instituição) para auxiliar na adaptação ao ambiente de trabalho/acadêmico.
Portanto, podemos direcionar nossa plasticidade cerebral quando criamos expectativas para nossas experiências. Leituras prévias de um determinado assunto irão paulatinamente direcionar a atenção e a plasticidade cerebral para o tema a ser estudado ou o novo processo a ser implementado. Importante que os líderes possam ir gerando insights a cada nova tarefa ou desafio, direcionando a atenção e o foco, e gerando expectativas que diminuam a resistência aos novos conteúdos, como se fossem as “cenas dos próximos capítulos”.
Se nossa neuroplasticidade, atenção e foco podem ser autodirigidas, como podemos gerar uma espiral crescente de envolvimento com nossos estudos e aprendizagens, com nosso trabalho e interrelações? Nakamura e Csikszentmihalyi (2002) nos oferecem uma teoria de como gerar um estado de fluxo (flow). As condições para o flow consistem em: 1. Perceber os desafios e oportunidades para aumentar habilidades existentes, e 2. Metas claras (a meta final e o passo a passo para alcançá-la) com retroalimentação imediata a cada nova etapa da meta. Sob estas condições os autores afirmam que a experiência se desenrola perfeitamente momento a momento, em um estado subjetivo com as seguintes características: – concentração intensa e profundamente focada no aqui e agora; – sensação de controle; – distorção do tempo, que parece passar mais rápido; – autotranscendência, com a sensação de perda da consciência de si e uma fusão com a atividade, aumentando a noção relacional do indivíduo; – uma motivação intrínseca, na qual a atividade passa a ser motivacional em si mesma, e a recompensa se torna estar mergulhado na atividade.
As implicações desta teoria para a memória e aprendizagem são inúmeras, tanto nos ambientes educacionais, quanto no trabalho. Para a memória, o indivíduo passa a ter mais possibilidades de conexões na atividade ou estudo no qual está envolvido; quanto maior o foco e atenção, maior a capacidade de retenção e resgate das informações, bem como, o número de conexões envolvidas na atividade, facilitando toda a aprendizagem correlacionada posterior. No que tange aos sistemas emocionais, o fato de o estado de flow gerar uma sensação de controle, mesmo que momentâneo, diminui a ansiedade e o estresse.
O estresse crônico é deletério para a memória e cognição (Peavy et. al., 2009), sendo que neurônios da formação hipocampal morrem ou se tornam menos ativos durante estes períodos. A neurogênese adulta (nascimento de novos neurônios) ocorre amplamente na região hipocampal durante os períodos mais amenos, com pouco estresse, boa alimentação e estimulação neural (Praag, Kempermann e Gage, 1999). Durante o estresse crônico e eventos traumáticos há diminuição da atividade hipocampal (memória consciente) e aumento da atividade da amígdala (memória inconsciente), no que podemos concluir que durante períodos prolongados de estresse, lembramos menos dos eventos e fatos da vida, mas agimos de forma inconsciente de maneira mais vigorosa aos mesmos. Essa sensação de não controlar a vida leva a ansiedade e a depressão, distorcendo nossas memórias e diminuindo nossa capacidade de atenção e foco.
Também, devido à pequena capacidade da memória de trabalho, pequenas porções de aprendizagem são melhores do que muito tempo em workshops; aquela imersão de 3 dias para aprendizagem seria interessante no que tange ao aumento das conexões entre os colaboradores, mas pode surtir pouco efeito em termos de treinamento efetivo, quando comparado com uma tarde produtiva de estudos e troca de ideias, com pequenas e variadas doses de informação.
Por outro lado, Inagaki e colaboradores (2015) utilizando imageamento cerebral por ressonância magnética demonstraram que quando as pessoas se sentiam excluídas, era detectada maior atividade na porção dorsal do córtex cingulado anterior, a região neural envolvida no componente angustiante, ou de ‘sofrimento’, da dor. As pessoas que se sentiam mais rejeitadas tinham os maiores níveis de atividade nessa região, e agiam de forma mais agressiva. Em outras palavras, o sentimento de exclusão pode provocar o mesmo tipo de reação no cérebro que a dor física.
O cérebro humano é um órgão social. As reações fisiológicas e neurológicas são direta e profundamente moldadas pela interação social. Apoiar equipes colaborativas e criar um ambiente que fomente mudanças produtivas gera conforto e melhores respostas fisiológicas. Respostas às ameaças, em geral, são desencadeada em ocasiões sociais e tendem a ser mais intensas e duradouras do que as respostas às recompensas. Bons líderes devem oferecer ambientes que propiciem segurança, autonomia, senso de justiça, boas relações interpessoais e percepção de si mesmo como em ascensão social.
Indivíduos que percebem a si mesmos como tendo oportunidades de ascensão social, que acreditam em suas atividades e atitudes como alavancando suas vidas apresentam maior ativação nas áreas de recompensa do cérebro, diminuindo seu envolvimento em atividades de risco, bem como, o uso de drogas psicoestimulantes e álcool.
Bibliografia:
Inagaki, T.K., Muscatell, K.A., Moeini, M., Dutcher, J., Jevtic, I., Irwin, M.R., & Eisenberger, N.I. (2015). Yearning for connection? Loneliness is associated with increased ventral striatum activity to close others. Social, Cognitive, and Affective Neuroscience. Inagaki(2015)SCAN.pdf
Nakamura, J., & Csikszentmihalyi, M. (2002). The concept of flow. In C. R. Snyder & S. J. Lopez (Eds.), Handbook of positive psychology (pp. 89-105). New York: Oxford University Press.
Peavy, G. M., Salmon, D. P., Jacobson, M. W., Hervey, A., Gamst, A. C., Wolfson, T., et. al. Effects of chronic stress on memory decline in cognitively normal and mildly impaired older adults. American Journal of Psychiatry, 166, 1408 1384–1391. 2009. doi: 10.1176/appi.ajp.2009.09040461.
Praag, H. van , Kempermann, G. e Gage, F. H. Running increases cell proliferation and neurogenesis in the adult mouse dentate gyrus. Nature Neuroscience.2, 266 – 270. 1999. doi:10.1038/6368.
Price, D.D.; Verner, G.N. e Schwartz, J.M. Plasticity in brain processing and modulation of pain. Progress in Brain Research. 157, 331-353. 2006. doi: 10.1016/S0079-6123(06)57020-7.